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Laroyé! Épa Babà!

Este Carnaval não foi igual a nenhum outro que passou... e, creio, não haverá parâmetro em futuros desfiles para explicar a catarse em que se transformou a passarela do samba, no Rio de Janeiro, com os enredos apresentados pelas Escolas de Samba.  O maior espetáculo da terra se transformou no maior manifesto da cultura preta base-formadora-esteio desse povo mestiço de muitas cores, etnias, línguas e conceitos como jamais visto, aceito, esperado e necessário.

A pandemia correu mundo, medo e morte, calou tambores, fechou missais e bíblias, guardou tempo e preceito, extinguiu risos e alegrias, atingiu casa grande e senzala, não poupou ninguém. Veio forte, faminta, devastadora, fome de tempos, gana do matar, cova aberta a céu aberto, dor no peito dilacerado. E matou, arruinou, destruiu. Protegida pelos descrentes, capitães de gado, senhores de curral, inescrupulosos líderes e pastores da injustiça correu mundo, de dentes arreganhados, terror, apocalíptica, Peste, Morte, Fome, Guerra, juízo final...

Joelhos ao chão, oferendas, pedidos, preces, rezas, iluminação, cura, sobrevivência do corpo, da alma, da cultura, do perpetuar de povos de todas as cores, unidos em comunhão de fé, pelo bem maior da raça... HUMANA, sem distinção, sem mordaça ou grilhão de qualquer cor ou forma. Saiu a máscara, a vacina chegou, povo dançou, comemorou o retorno do tambor, do toque, do afoxé, da missa, do ritual, da louvação, agradecimento. O Sagrado atendeu e outra vez a luz venceu, caminhos de saber, do bem fazer e o mal vencer.

Exu e Pombagira com marafo e dendê se sentaram à mesa da Tradicional Família Brasileira, convidados VIP, credencial “Trânsito Livre”, em verso e prosa, vermelho e preto. O chorar das ondas cortadas pelas calungas cruzando oceanos de sangue negro e dor ressoou forte em Iphones e plataformas digitais, derrubando seguidores de pseudo-influencers que nada tem a dizer, calando bocas de afofô, libertando o grito dos excluídos, de Estamiras por esse Brasil a fora ... fala Majeté!

O batuque do malandro do beco marginal das favelas, Seu Zé, exu de encruzilhada, e Maria Padilha, rainha da madrugada, ecoou das vielas, marcado no atabaque, no timbau, no adjarin e aguidaví ditando ritmos, preces e chamamentos... E eles desceram, vieram, chegaram, dançando e cantando, plena energia, boca que tudo come, olho que tudo vê, caminho, segredo, sagrado, social, vital, mastigando conceitos, separatismos, preconceitos, intolerância, misoginia, desrespeito, exclusão... Festa Para Deuses Negros na Corte Niloargoliana da Marquês de Sapucaí!

A.J.Hamilton
Do arco íris da serpente Dan, Oxumare, vieram Oxuns e Yemanjas de leque abebé; Oguns, de espada na mão em luta contra o dragão da intolerância... Omolus e Obaluaiês mastigando doenças e mazelas da alma e da chibata, e as cuspindo nos pântanos onde velhas senhoras do barro da vida, corujas da eternidade, saluba, moldam novos seres imbuídos com o sopro da vida de um novo tempo de Oxalá, de respeito e lugar de fala e destaque. Vieram Iroko, Ewa, Osain e Logun... Okô, Obá, Ghyan e até os erê, curumim Ka’u’hê, todo o povo de aruanda pra vencer demanda!
Carybé

Sou da fé, do axé, da arruda e guiné, benção meus velhos, meus ancestrais! 

Cantaram pretos, mulatos, mestiços, reis, princesas, guerreiros, imortais...

E as cores de Exu, preto e vermelho encarnado, irão tomar a avenida no desfile das campeãs, invertendo o batuque do xirê, onde ele é primeiro e inconteste. Exu abriu caminhos, não deixou portas fechadas, arreganhou as encruzilhadas para o povo negro passar. Vai retornar, faceiro, campeão, ladino, justiceiro, boca que tudo come, olho que tudo vê, fechando na madrugada, no romper da alvorada sua gargalhada vai ressoar...

A abertura da festa deixou para Oxala, respeitado e velho senhor, branco da paz e harmonia, chegando em águia altaneira, paciência, sabedoria, sobrevoando o baobá, fresco remanso, trono de descanso para o igbin ancião, Epa Baba! O tempo é tempo quando Oxala chegar. E o tempo chegou. Exu anunciou, riu, gargalhou, abriu o portão para as águas, lento e doce caminhar de meu Pai Osaalá.

E o transgressor Exu se manifestou em outros grupos, o Besouro Mangangá, deu o título ao Império Serrano, da Serrinha de Madureira do Jongo de Tia Maria de Resistência Negra de Pele Preta rogai por nós.

Sinal de novos tempos, farol no horizonte, quebra de correntes, Anastácia nunca mais, grito guardado no peito: BASTA!! Abrem-se os portões, descerram a cortina, entra em cena povo pretooooooooo, chegou a horaaaaaa... traz para a rua seu canto, dança, cultura, raiz, fé, joga na rua o padê, abre os caminhos que Exu vai passar, gargalhante e brincante, arrelio, com fome ... de VIDA, DE ARTE, DE MARCAR PRESENÇA NO SOLO PRETO DESTE PAIS DE CAROLINAS, STELAS, MILTONS, XICAS, DAYANES, NITINHAS, DANDARAS, ZUMBIS, OLGAS, GILS, BESOUROS E TANTOS OUTROS SEM NOME, INDIGENTES NUNCA MAIS.

Rogerio Madruga, Brasileiro, Mestiço, Omon Osaalufon, amante da festa pagã mais sagrada do mundo.


2 comentários:

  1. Rogerio Madruga amei o texto.
    A elite preconceituosa teve de se render ao batuque da senzala e bater palmas para a nossa Cultura de matriz africana.
    Nunca a Sapucaí foi tão negra como esse ano.
    E o mais formidável foi a reverência a Exu que reinou de forma impactante.
    Somos, querendo ou não, o povo que bate cabeça nas roças e nos terreiros.
    LAROYÊ EXU!!!

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  2. Pensei em comentar sobre este seu artigo mas, resolvi nada falar, pois, seria redundante. Como dizem hoje em dia: É sobre isso! Parabéns!

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E aí!? O que vc tem a dizer sobre isso?