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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

Impressões de um folião de Momo

Por Rogério Madruga

Foto J.R.Antunes

E o tempo da serpentina e do confete voltou. O giro da baiana, o esplendor dos pavilhões, a corte e elegância dos casais de MS e PB, o fausto das alegorias e a beleza das fantasias... tudo ao som da música maior da cultura nacional, o Samba.

E na noite de domingo, abriu o espetáculo o Império Serrano mostrando que seu lugar deve ser entre as grandes. Tradição merece respeito. A despeito de falhas, fez um desfile coeso e grandioso em homenagem a um grande artista... Flores em vida para Arlindo Cruz... Serrinha chorou de alegria.

A atual campeã, a tricolor de Caxias, ficou só com o bagaço da laranja no enredo homenageando Zeca Pagodinho. Vindo de um campeonato apoteótico, a Grande Rio não apresentou o mesmo nível e fez um desfile arrastado, mesmo com um refrão chiclete no samba enredo, pesando a mão em fantasias. Aplausos para o setor dos erês, lúdico e doce e, também, para a sacada na composição da fantasia do primeiro casal: É Ogum, é abre caminho, é vence demanda..

A Mocidade Independente de Padre Miguel em justa homenagem a Mestre Vitalino trouxe alegorias com acabamento ruim e falta de cuidado estético, embora com boas ideias na concepção ao (re)utilizar materiais que seriam descartados, como sarrafos de madeira,  latas de tinta e galhos secos. O samba nada empolgante não atrapalhou o bailado da bela roupa do primeiro casal de MS/PB.

A Unidos da Tijuca passeou pela Baía de Todos os Santos com as pinceladas ousadas da paleta do seu carnavalesco e trouxe uma acertada e necessária Yemonja preta, em belo espetáculo de sua Comissão de Frente. Figurinos variados, fugindo da mesmice e na assinatura particular de seu carnavalesco. Erros na última alegoria afastam a possibilidade de o Pavão levantar o caneco.

O Salgueiro pintou a avenida de vermelho, branco e luxúria com seus delírios... Alegorias gigantescas quase levam a erro logo na cabeça da escola. Reincidente, aliás. Belas cores, excelência em acabamento dos carros e figurinos luxuosos são prejudicados pela evolução. Na comissão de frente, bela concepção do elemento alegórico e dos componentes, porém, a coreografia ficou sem dizer a que dança veio. Terá sido delírio?

A Estação Primeira fechou a primeira noite dos desfiles dando um show com sua bateria. Teve paradinha para todos os gostos. O samba funcionou e a arquibancada respondeu ao passar da verde e rosa. A primeira porta-bandeira estreou com pé quente na defesa do pavilhão de Cartola. Mangueira arrebata a todos com um desfile coeso, rico e criativo, deixando sua comunidade com vontade de gritar “é campeã!”.

É isso, sono bateu... Amanhã tem mais.

E a segunda noite chegou e o público aguarda ansiosamente por mais um espetáculo na Marquês de Sapucaí. Uma noite de grandes desfiles e, principalmente, de grandes histórias...

Você já tinha pensado em como o búfalo chegou na ilha de Marajó? Foi isso que a Paraíso do Tuiuti trouxe para avenida: a história da chegada dos búfalos na ilha do Pará. Outra vez, a professora Rosa Magalhães e João Vítor brindam o público com um enredo cheio de informações históricas, trabalho típico da mestra dos campeonatos. Afora isso, a azul e amarelo de São Cristóvão cruza a avenida com alegorias bonitas, belas fantasias e uma comissão de frente bastante impressionante contando a história do mogangueiro e encantando o público. Parabéns,  Tuiuti, por um desfile bastante expressivo.

A Portela faz um dos desfiles mais aguardados do ano, afinal, não é todo dia que se comemora 100 anos.  A majestade do samba abre seu desfile trazendo seu símbolo maior, a águia altaneira, em dourado e cravejada de joias. Nada mais justo para quem faz 100 anos de avenida. Então, todo respeito e todos os aplausos a azul e branco de Madureira. Todavia, erros primários por problemas mecânicos em carros alegóricos tira a possibilidade de a águia de Madureira levantar o caneco no seu Centenário. Levando para a avenida toda a sua história em um desfile orquestrado,  a azul e branco peca pela falta e também pelo excesso: drones pontilham a avenida estrelando um céu em azul e branco. Emocionante, porém não fazem parte dos quesitos julgados. Faltaram histórias da história da maior campeã do Carnaval carioca. Parabéns, Portela pelo seu Centenário, e que venham muitas novas comemorações.

Terceira a desfilar, a Vila Isabel faz um espetáculo arrebatador na Marquês de Sapucaí com luxo, excelente acabamento, criatividade, alegorias bem pensadas e um São Jorge que encantou a avenida. A swingueira de Noel manteve o ritmo e garantiu à Vila Isabel um dos melhores desfiles da noite. E se o enredo eram Festas, a Vila Isabel fez festa ao se colocar como favorita ao campeonato de 2023. Paulo Barros, o carnavalesco, se esmerou em belos figurinos e alegorias e fez um dos melhores desfiles de Carnaval de sua história.

Quarta agremiação a desfilar, a Beija-Flor de Nilópolis, rolo compressor da passarela, traz uma nova versão para o 7 de Setembro e questiona: se não fosse como a história nos conta, de quem seria o protagonismo? Reconhecida pelo seu grandiosismo, a Deusa da Passarela apresenta problemas na primeira alegoria: um incêndio que, embora tenha sido na área de armação, pode comprometer a escola com a perda de décimos no quesito Alegorias e Adereços. Samba funcionando, comunidade cantando com força, a Beija Flor faz um desfile grandioso, informativo, histórico e questionador. A plástica, porém, não seguiu a máxima “o menos é mais”, substituída pelo “mais é demais”... mal acabamento em alegorias e fantasias repetitivas, visualmente pesadas, levaram a uma confusão estética, ofuscando o brilho do desfile, sem tirar seu mérito de ensinamento. Deixa Nilópolis cantar....

Penúltima escola a entrar na avenida, a Imperatriz Leopoldinense nos conta em formato de cordel lúdico a história de onde foi parar Lampião após ter sido recusado no inferno e também no céu. Então, Capitão Virgulino, o que aconteceu? Leandro Vieira, carnavalesco da verde e branco de Ramos, faz uma pesquisa histórica e apresenta na avenida um desfile recheado de belas fantasias, inusitadas alegorias,  excelência em acabamento e uma paleta de cores impressionante que faz com que o espectador não pisque os olhos para não perder nada. Destaque para a Comissão de Frente e a figura de um cachorro bastante extrovertido, brincante e brincalhão... um retrato do nordeste na Marquês de Sapucaí.

Pintura de Rosa Egipcíaca
feita pelo artista Galindo
Acervo Luiz Mott
Fechando a noite, a vermelho e branco de Niterói traz para a avenida o enredo sobre uma personagem pouco conhecida do público: Rosa Maria Egipcíaca. A Viradouro, em uma obra relevante do carnavalesco Tarcísio Zanon, apresenta na avenida a história completamente desconhecida de mais uma personagem que os livros de História não nos apresentaram. Em um desfile com cores de campeonato, a Viradouro faz uma passagem praticamente irretocável pela Sapucaí com lindas fantasias, belíssimas alegorias com cores corretas fazendo do amanhecer desta terça-feira de Carnaval o palco perfeito para o encerramento dos desfiles de 2023. Evoé, Viradouro, pelo espetáculo grandioso.

E assim, se encerram os desfiles do grupo especial neste ano de 2023. Se, na primeira noite de desfiles tivemos uma grande expoente - nessa minha análise muito particular - que foi a Mangueira, nessa segunda noite o caldo engrossou, as plumas se embolaram e a briga pelo caneco será das melhores como não se via há bastante tempo.  Aguardemos a Quarta-feira de Cinzas, cada um puxando brasa para sua sardinha e se segurando em suas crenças. Mais uma vez, Evoé, Carnaval Carioca,  Evoé, Cultura Brasileira e vamos aguardar os resultados.


Rogério Madruga é Produtor Artístico e Podcaster - rogerio.m.madruga@gmail.com