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As Nuances do Racismo e da Intolerância Religiosa

 Por Profº. Drº. Babalawô Ivanir dos Santos (PPGHC/UFRJ, CEAP e CCIR)

Casos de racismo vem eclodindo cotidianamente no Brasil e no mundo! Ou melhor, vem sendo evidenciado e noticiado. E uma só pergunta, que desencadeará outras perguntas, alimentam o pensamento de todos aqueles e aquelas que vêm ao longo das últimas décadas promovendo ações incisivas na luta antirracismo: “Até Quando? 

 

Até quando vamos precisar parar os nossos filhos e netos para jamais esquecerem de sair sem levar a carteira de identidade, a carteira de trabalho, e agora até o comprovante de aquisição de um bem, como por exemplo uma simples bicicleta? Até quando vamos ver balas perdidas, ou melhor, “achadas” em corpos negros? Até quando vamos escutar que não precisamos de cota e que as questões das desigualdades no Brasil são facilmente resolvidas com redistribuição de rendas? Até quando vão marginalizar a cultura produzida pela população negra e criminalizar ou demonizar as nossas práticas religiosas? Um criminoso não é religioso. Sem precedentes tentar identificar ou reconhecer peças de rituais africanos, como se pudesse legitimar ou justificar um desequilíbrio mental.                                                                               

Cá do meu canto eu vos digo que não temos respostas prontas para essa pergunta e outras tantas que serão suscitadas e elencadas quanto o tema for RACISMO. Mas lhe convido a fazer um mergulho profundo para que possamos compreender as bases históricas das construções e estruturações da sociedade racializada, que se chama Brasil, que durante anos fortaleceu a ideia de degeneração e naturalização para a criminalidades das populações negras. E para tal compreensão lhes chamo a atenção para o caso que aconteceu em junho desse ano, no bairro do Leblon, zona sul da cidade do Rio de Janeiro, em que Matheus Ribeiro, jovem negro, foi veementemente acusado por um casal branco, de ter furtado uma bicicleta, sem nenhuma prova que pudesse corroborar com tal acusação. O caso, que por si só já é carregado de estereótipos, racismo e visão hierárquica de sociedade que coloca pessoas negras sempre na condição de algozes. Mas, tal repercussão ganhou ainda mais ênfase e um olhar sobre as estruturas sociais radicalizadas quando no processo de investigação consta que o ladrão do caso, por ironia, é um homem branco e morador na zona sul. 

 

Isso não é uma tragédia! É uma constatação de que o racismo na sociedade brasileira ainda está engendrado nas relações sociais cotidianas e permeia os olhos daqueles e daquelas que não vislumbram a possibilidade, ascensão, poder de compra e aquisição de bens por parte da população negra sem estar atrelada ou vinculada à criminalidade. Para esses e essas a única finalidade de um jovem negro andando nas ruas dos bairros “nobres” carioca, é interpretado para fins criminosos.

 

Ou seja, não nos é dada a possibilidade de ser ou querer ser alguém para além dos condicionamentos radicalizados da sociedade que nos "coisificam" e criminalizam os nossos corpos. E o pior, logo depois a Justiça do Rio de Janeiro decidiu arquivar o inquérito que apurava o "suposto" crime de racismo.

Trago esse caso, mas depois dele, outros vieram, mas esse é um bom exemplo do racismo condicionado que vivemos há anos. Um brevíssimo passeio sobre os livros de história nos permite compreender que a criminalização dos corpos negros, alimentadas pelo racismo, se fizeram presentes desde o forjamento da sociedade brasileira. Precisamos reconstruir as nossas estruturas e relações sociais.



IVANIR DOS SANTOS - Babalawô, Dr. Prof. do Programa de pós-graduação em História Comparada da Universidade Federal do RJ, interlocutor da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR) e Conselheiro Estratégico do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (CEAP)

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3 comentários:

  1. Maravilhoso, desmembrou cada camada detalhadamente

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  2. Sem palavras! Muito esclarecedor por ser tão bem fudamentado!
    Obrigado, Babá!

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  3. Costumo dizer que o Brasil é um país ainda em construção, porém, precisando se desconstruir, se descolonizar, e não há outra forma disso acontecer que não seja através da EDUCAÇÃO, do conhecimento da nossa REAL história. Obrigada Babá por sua reflexão!

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E aí!? O que vc tem a dizer sobre isso?